30.1.02

Recesso


Este é meu verdadeiro lugar
É de onde eu vim
E pertenço a esse espaço

Não quero o banal
Não aqui
Nunca aqui

Eu não desisti

25.1.02

Resposta ao Sr. do Alto


Textos sem adaptação para o novo meio = um labirinto longo e sinuoso, onde se pode chegar à sua saída, mas com grandes possibilidades de andar muito mais e sem necessidade. Isso se houver uma saída.

Hipertexto = ainda um labirinto. Menor, menos sinuoso e, apesar de seus vários caminhos alternativos, existe a certeza de uma saída. E ainda te dão uma bússola.

O labirinto textual é um passatempo de jornal, onde a resposta vem no dia seguinte: quem guardará o labirinto para o dia seguinte?

O labirinto hipertextual é um passatempo de jornal, mas sua resposta vem na mesma edição: basta ser esperto e virar o jornal de cabeça para baixo.

23.1.02

Coleta seletiva


Estou novamente chafurdando em informação. Não se acham pérolas para os porcos midiáticos. No meio de toneladas de textos unidos por sublinhados, os porcos modernos só conseguem se perder em um labirinto de lixo. Acharam que o ciberespaço seria um bênção. E é, mas não para os porcos conectados: não há bússola hipertextual para eles.

22.1.02

Interzona

Eu criei esta armadura
Com minhas próprias mãos e suor
E controlo meu castelo
Nesse espaço

A energia que consumo
Passa por essas sinapses inchadas
De informação
E caos

O terreno do meu castelo é alto

20.1.02

Pintando o 7


Fazer arte
É fazer bagunça

Cavernas


É estranho pensar que um homem das cavernas possa ser mais evoluído, em qualquer âmbito, que eu. Mas quando vejo alguns desenhos rupestres, isso fica claro: eu não tenho a habilidade deles para desenhar. Alguns deles são muito bem feitos.

E claro que não é a sua habilidade com as mãos e as tintas que o torna uma pessoa evoluída. É incrível pensar que uma pessoa que mal dominava o fogo possa ter a inspiração para a arte; Alguém que precisa caçar pro seu sustento ter o espírito para desenvolver um senso estético é algo espantoso. O impulso criador que o anima é o mesmo de um Rafael, um Botticeli, um Mondrian. O valor de sua arte é o mesmo.

17.1.02

Chaos


Você acorda um dia com um velho sentado na sua cama. Ele brilha. Antes que você esfregue o sono da cara, ele fala:

– Levanta, infiel! Reverencia teu Deus!!!
– Vai–te a porra!!!

Foi instintivo. Mas porque você ia acreditar num velho que invadiu sua casa? Ainda mais dizendo ser Deus? Só porque ele brilha? Poderia ser alergia a algo que ele comeu.

– Passaste muito tempo na iniquidade, seu blasfemo! É a hora do teu julgamento!
– Queisso, véio?!?! Como você entrou aqui?? Que merda de brilho é esse???
– Esse brilho está acima da sua compreensão, infiel! Levanta!!
– Sai daqui, seu velho maluco!!! Vou chamar a polícia!!!

Impasse formado, você não tinha ideia do que fazer. Os olhos de velho faiscavam de raiva. Você começa ficar extremamente nervoso com a insólita cena. E olha que, apesar de ateu – graças a Deus!, você sempre brincava – você nunca faltou ao respeito com nenhuma espécie de religião. Cada um na sua, ora essa! Mas porque diabos (ops!) Deus em pessoa viria te buscar?

– Porque você é o maior dos ateus! - disse o velho, lendo sua mente - Servirá como exemplo àqueles que não se arrependerem na hora do julgamento. Você não cumpre o primeiro mandamento, o mais importante. Vamos pecador! É tempo de sentir minha cólera sagrada!

Cansado dessa história, você pega o revólver na cabeceira da sua cama e acerta um tiro na testa do velho. Ele cai, estertorando, pra trás.

– Puta merda!!! Foda-se! Legítima defesa… ele invadiu minha casa.

Você liga pra polícia, e avisa que atirou num maluco que invadiu sua casa. Os canas chegam e não encontram nada além do cheiro de pólvora. Corpo, bala, sangue…nada. Você toma um esporro colossal do guardinha que foi até sua casa, que avisa que do mesmo jeito terá que prestar depoimento na DP. Você ouve tudo se achando maluco, achismo que é compartilhado com os policiais, que te acham no mínimo, um drogado. Da pequena aglomeração na porta do seu apartamento, alguém grita: "Nietzsche!!!"

Lá fora, nuvens negras avançam rapidamente no horizonte. Muito rapidamente.

16.1.02

Caostrofobia



Aquantidadeabsurdadeimagensquebombardeiasuamentepodeestarsemvocêsaberteinduzindoafazercoisasquenaoquercriarhábitosque
nuncateria.Mensagenssubliminarescortamossinaisderádioetvevocênãopodefazernadaarespeitoanãoserevitaroqueháderuimnosmeiosde
comunicação.

15.1.02

Pródigo


Ele voltou em um dia nublado. Ninguém esperava: a casa estava uma bagunça, não tinha uma comida especial pra ele. Como havia dito, ninguém esperava.

Havia saído de casa depois de uma ríspida discussão com o pai. Jurara nunca mais voltar. E quando o pai, não o levando a sério, disse que ele voltaria com o rabo entre as pernas pra pedir dinheiro em dois dias, ele sumiu. Estava fora há seis anos. Ninguém o esperava.

A mãe adorou a volta dele, claro. Choros, abraços, "como você está/por ande andou?" e o que pede a etiqueta do momento. O tempo o tornara um homem. A saudade tornara a mãe uma velha.

Ele não sabia e nem imaginava o que sua ausência havia provocado. A casa em sua memória agora só existia na foto que havia levado. Sua infância de filho único não poderia ter se passado ali. Não naquela casa sépia, como uma foto desbotada.

A mãe contou que a partida dele acabara com a alegria da casa. Disse-lhe que ele era o orgulho dela e do pai. Os dois esperaram ele voltar durante 2 anos. Rezavam em fronte a uma vela toda noite. Desistiram, quando a esperança se apagou. Hoje, a esperança morta é só um pedestal com parafina derretida.

Ele queria ver o pai. Segundo a mãe, o pai era quem mais tinha sofrido. No final, se julgava o único culpado de tudo. Foi definhando. Como a casa, as velas, a esperança. Estava trancado no quarto fazia dois dias.

Ele entrou no quarto, e o pai estava na cama, mais sépia que a casa. Imóvel. O cheiro denunciava o que ele tentara evitar com sua volta apressada. O pai não o esperara.

14.1.02

Gente séria tem me tirado do sério...

Tempos Modernos

A angústia de quem escrevia antigamente era mais tátil.
Não sai nada?
Ou nada que sai presta?
Ao lixo com a folha
Externava-se a raiva, abria-se a válvula de escape
As vezes, surgia o assunto tão esperado
Mas e hoje?
A angústia é a mesma…Mas
Como amassar essa folha virtual na minha frente?
Como rasgar um monitor?
Ele nem cabe na lixeira…
Quem gosta de frases edificantes é mestre de obras…

13.1.02

O Chamado


Levara sete anos pra atender o chamado da Cidade. Desde os 12 anos, ouvira falar de tal chamado e não dera a mínima. Todos os seus amigos, de uma forma ou de outra, já tinham atendido ao chamado, que de onde moravam, se ouvia alto e claro. Menos ele.

Morava perto da cidade. Mas o mais longe que tinha levado seu corpo era até a cidade vizinha, vizinha da Cidade. Não era implicância. Simplesmente não tinha motivos para ir. E a Cidade o chamava. Ele, todo ouvidos de mercador.

Ao 19 anos, não que tivesse tomado a decisão, teve que ir à Cidade. E foi. Para atender um pedido dos pais, mais foi. E o chamado da Cidade finalmente bateu forte. Ao ver seus vales de concreto, seu movimento, sua gente, o chamado ribombou em seus ouvidos. Ele precisou ser dominado pela Cidade, absorvido.

Foi o primeiro dos amigos a se mudar para a Cidade. Depois disso, voltou poucas vezes para casa.

***

Foi feliz na Cidade. Criou amigos, cachorros, família. Raízes, como dizem. Ninguém da Cidade poderia dizer que ele viera de outra cidade. Absorvera seus gestos, sua fala, seus movimentos. Na outra cidade, os poucos que se lembravam dele, tinham saudades.

***

Ficara, como todos um dia ficam, velho. A cidade já era seu lar, sua vida. Mas sentia, no fim da sua vida, falta de algo que não conseguia decifrar o que. Sua casa, sua prole, sua vida estava já pronta para serem entregues: já não eram seus. Mas algo ainda faltava. Não era na cidade que escolhera viver que conseguiria suprir essa necessidade.

***

A outra Cidade começou a entoar seu chamado. Levou três anos para atendê-lo.

11.1.02

Autocrítica


Qualquer pessoa que escreve algo para outra ou outros, sem que essa ou esses lhe peçam, sem que se receba por isso, sem ter algo edificante pra falar ou é uma pessoa insuportavelmente convencida ou incrivelmente estúpida. Ninguém dá a mínima pro que você acha do último livro que leu, filme que viu, cd que comprou ou dvd que alugou. Ninguém perguntou sua opinião sobre o que outra pessoa com seus mesmos defeitos escreveu em outro lugar, com a mesma intenção que você, ou sobre o que tem acontecido na Argentina ou sobre a seleção brasileira de futebol. E ninguém, NINGUÉM mesmo, quer ouvir suas críticas sobre o que quer que seja. Afinal de contas, quem é você pra criticar alguém ou alguma coisa? Você é uma pessoa que gasta seu tempo (in)útil – que parece ser grande, aliás – escrevendo baboseiras ao vento como se fossem recados para posteridade. No que isso pode te dar crédito?

Deficiente


Não sei porque...às vezes tenho a impressão que fiquei em recuperação no teste do pezinho...

10.1.02

Teoria do pensamento aleatório

Capítulo 6

Um hábito salutar é cortar com tesoura as conversas. Pegue os recortes, atire pro alto, e cada interloucutor pega o que conseguir. Por alguns momentos, a conversa quedará sem sentido. O fluxo de idéias, assim que restabelecido, tornará o papo mais fluente. O caleidoscópio oral criado poderá ser exposto em alguma galeria de arte.

Amortizados


Eu vi um homem morto essa manhã
Embrulhado pra presente, em seu papel amarelo
E não senti nada
Estava deitado em um ponto de ônibos
até concorrido]
E os transeuntes, como eu, nada sentiram
Quase lhe pediam licença
– Meu ônibus chegou, saia do caminho –
E não olhavam para trás

O rabecão que o levou
Não cobrou vale–transporte

7.1.02

Virtual

Vamos evoluir
Como vírus que se adaptam
Às adversidades
Vamos nos unir
Em conexões que se façam
Na interatividade
Redes neurais vão ruir
Sob o peso das memórias RAM
E dos córtex de alta velocidade

E o pensamento, antes único, será um só
E pensamento coletivo, de cada ser só
Vai ser livre em sua individualidade
Vai ser único em sua una liberdade

4.1.02

Conclusão


O inferno são os outros
De boas intenções, o inferno está cheio
E o inferno é aqui

Das boas intenções
Dos outros
Já estou por aqui

3.1.02

nonsense


As boas coisas dessa estrada fértil garantem, hoje, indivíduos já leves. Melhores níveis operacionais permitem que respire sem trabalho: uma vida xilográfica, zen.

2.1.02

Teoria do pensamento aleatório

capítulo 5

Se meus pensamentos todos coubessem nesse copo vazio aqui na frente (é um copo grande: cerca de 400 ml), o resultado seria uma mistura heterôgenea, sem a menor uniformidade. Fragmentar, podemos dizer caleidoscopicamente.

Não sei até que ponto a culpa de se ter sempre uma cadeia de pensamentos randômica é desse padrão de vida caótico em que vivemos. Até aí, também, isso não importa muito. O que não podemos fazer ao analisar essa questão é esquecer que desde o começo das nossas vidas, sempre tivemos uma ligação muito próxima com o caos. Para sermos o que somos, tivemos que vencer milhares de espermatozoides e todos tinham a mesma chance de fecundação.

Ano novo


O ano novo não vai te trazer nada de novo. Os dias continuarão tendo 24 horas e as semanas sete dias.

Suas funções biológicas serão as mesmas: você vai continuar morrendo e vivendo pelos mesmos motivos.

As pessoas também não mudarão, apesar de todas as promessas feitas.

E por pior que isso possa parecer, não é pessimismo. É uma simples constatação feita através da observação continuada desse evento chamado cotidiano.

Caostrofobia


OvirtualnãoseopõeaorealesimaoatualOvitualéoqueviráoupotencialmentevirácriandoumarealidadequenãoestámaisquepoderáestarÉumreal
diferentecomoutrosignificadoeoutromomentodeexplosão.orealéopossiveleovirtualéumarespostaaoatualsendoseutotaldesemelhante.