22.2.02

Conformismo


Considere-se perdido nesse mundo ultra-tecnológico e perca a esperança de ter algum senso de direção pelo menos por enquanto. Não há armas para lutar, não há bússolas, não há guia 4 rodas para caminhos virtuais. Deixar-se levar pela corrente internética é a única opção por ora. Crie seus simulacros, seus personagens seguros, seus portos e tente sobreviver a isso. O mundo mudou, e a cada letra digitada, a cada pixel criado através de extensões dos seus dedos, ele muda, mais e mais. E nunca fomos realmente parte atuante das grandes mudanças. Digo, o homem comum, o que vive o dia-a-dia, o que acorda, trabalha, almoça, trabalha e dorme. Essa é só mais uma revolução onde sua influência é insignificante. Nada demais, nada demais.
Logo eu que tento ser moderno, acordei muito parnasiano hoje.

19.2.02

Cobiça


Começou desejando nascer, ter vida. Nasceu e desejava comida. Chorava por ela. Cresceu, e com isso, cresceram seus desejos: o carrinho do comercial da TV, a maior mesada, a mulher do amigo, um salário melhor. E desejava, e desejava, e desejava. Quanto mais desejava, mais desejava ainda. Desejava, e sua ganância conquistava o objeto. Tinha tudo, era rico, invejado. Desejou viver eternamente. Não pode: foi enterrado num caixão que não desejava.

15.2.02

Orgulho


Vejam como sou inteligente, articulado, divertido. Vejam toda minha erudição nos mais variados assuntos. Vejam como sou interessante, boa praça, bom partido. Vejam todo esplendor das minhas viagens, leituras e audições nas minhas conversas. Olhe bem, eu sou a alma de qualquer festa, o amigo perfeito, companheiro de qualquer hora. Oh, não caro amigo, dileta amiga, não sou perfeito. Minha auto-indulgência me mata!!! É isso mesmo! Sou modesto demais. Isso é ou não é um defeito?

Luxúria


Comercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercom
ercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomerco
mercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomer.

Gula


Comercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercom
ercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomerco
mercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomercomer.

Preguiça


Até porque, se livrar dos seus próprios defeitos, além de ser uma forma de auto-negação, dá um trabalho danado…Deixa isso pra lá.

Cólera


A inveja é o primeiro sinal. Como o semeador de vento, o homem que planta a inveja, só colhe a cólera. A raiva por não ter o que quer e por outros terem. Outros nos quais não se reconhece. O colérico é narcisista. Odeia a diferença. Odeia tudo que não seja seu reflexo.

Eu também odeio.

Odeio muita coisa, aliás. Encheria páginas e páginas com meu ódio. Mas não vou. Meu ódio vai ficar guardado, minando seu veneno. Meus defeitos são minha riqueza. Não me desfaço.

Inveja


Eu invejo os ricos
E suas peles bem tratadas e carros do ano
E casas na Zona Sul
Invejo os inteligentes
Com sua cultura e livros e
Amizades cultas e conversas cultas e
Interessantes
Invejo os que amam
Aqueles amores definitivos
"Não vivo sem você", "Você me completa" e
"Faço tudo por você"
Também invejo os felizes
Que nem são inteligentes
– como ser feliz num mundo como esse?–
Mas carregam aquele insuportável sorriso na cara
E a felicidade mais estúpida do mundo
O que me faz invejar os ignorantes
Invejo os sem-caráter,
Que com seu cinismo, sabem tirar o melhor
Para eles

Cá estou, falível e pecador.
Invejando até quem inveja algo que preste

14.2.02

Mais dia, menos dia…


Como se se tratasse de respirar
Como se se tratasse de aspirar
Algo
Como se se tratasse de criar
Como se se tratasse de abortar
Algo

Você não perde por esperar…

7.2.02

Volta


Nem toda volta é triunfal
Nem toda volta é esfuziante
Nem toda volta merece tapete vermelho, recepção para mil convidados, cobertura da imprensa

Mas toda volta representa uma conquista
Estar vivo após uma partida é uma conquista
A coragem da volta é maior que a da partida

Todos partem do mesmo ventre
E voltam para um mesmo ventre

Nada

Acordara com a mente vazia, mas tão vazia que nem disso tinha se dado conta. Somente abrira os olhos. E nada. Suas funções vitais iam, mas não precisamos pensar para isso, certo?

Estava na cama. Mas poderia estar em qualquer lugar. Aliás…estaria mesmo na cama? Não sabia dizer. Até porque, não teve essa dúvida. Não tinha dúvida nenhuma.

O que fazer? Havia algo? Queria algo? Não sabia.

Pode parecer abrupto, mas esse é o fim da história. Ficara o resto dos seus dias da mesma forma: imóvel.

Não saberia precisar quanto fora o "resto dos seus dias". E também não se preocupava com isso.
Morrera há tempo e não sabia.

30.1.02

Recesso


Este é meu verdadeiro lugar
É de onde eu vim
E pertenço a esse espaço

Não quero o banal
Não aqui
Nunca aqui

Eu não desisti

25.1.02

Resposta ao Sr. do Alto


Textos sem adaptação para o novo meio = um labirinto longo e sinuoso, onde se pode chegar à sua saída, mas com grandes possibilidades de andar muito mais e sem necessidade. Isso se houver uma saída.

Hipertexto = ainda um labirinto. Menor, menos sinuoso e, apesar de seus vários caminhos alternativos, existe a certeza de uma saída. E ainda te dão uma bússola.

O labirinto textual é um passatempo de jornal, onde a resposta vem no dia seguinte: quem guardará o labirinto para o dia seguinte?

O labirinto hipertextual é um passatempo de jornal, mas sua resposta vem na mesma edição: basta ser esperto e virar o jornal de cabeça para baixo.

23.1.02

Coleta seletiva


Estou novamente chafurdando em informação. Não se acham pérolas para os porcos midiáticos. No meio de toneladas de textos unidos por sublinhados, os porcos modernos só conseguem se perder em um labirinto de lixo. Acharam que o ciberespaço seria um bênção. E é, mas não para os porcos conectados: não há bússola hipertextual para eles.

22.1.02

Interzona

Eu criei esta armadura
Com minhas próprias mãos e suor
E controlo meu castelo
Nesse espaço

A energia que consumo
Passa por essas sinapses inchadas
De informação
E caos

O terreno do meu castelo é alto

20.1.02

Pintando o 7


Fazer arte
É fazer bagunça

Cavernas


É estranho pensar que um homem das cavernas possa ser mais evoluído, em qualquer âmbito, que eu. Mas quando vejo alguns desenhos rupestres, isso fica claro: eu não tenho a habilidade deles para desenhar. Alguns deles são muito bem feitos.

E claro que não é a sua habilidade com as mãos e as tintas que o torna uma pessoa evoluída. É incrível pensar que uma pessoa que mal dominava o fogo possa ter a inspiração para a arte; Alguém que precisa caçar pro seu sustento ter o espírito para desenvolver um senso estético é algo espantoso. O impulso criador que o anima é o mesmo de um Rafael, um Botticeli, um Mondrian. O valor de sua arte é o mesmo.

17.1.02

Chaos


Você acorda um dia com um velho sentado na sua cama. Ele brilha. Antes que você esfregue o sono da cara, ele fala:

– Levanta, infiel! Reverencia teu Deus!!!
– Vai–te a porra!!!

Foi instintivo. Mas porque você ia acreditar num velho que invadiu sua casa? Ainda mais dizendo ser Deus? Só porque ele brilha? Poderia ser alergia a algo que ele comeu.

– Passaste muito tempo na iniquidade, seu blasfemo! É a hora do teu julgamento!
– Queisso, véio?!?! Como você entrou aqui?? Que merda de brilho é esse???
– Esse brilho está acima da sua compreensão, infiel! Levanta!!
– Sai daqui, seu velho maluco!!! Vou chamar a polícia!!!

Impasse formado, você não tinha ideia do que fazer. Os olhos de velho faiscavam de raiva. Você começa ficar extremamente nervoso com a insólita cena. E olha que, apesar de ateu – graças a Deus!, você sempre brincava – você nunca faltou ao respeito com nenhuma espécie de religião. Cada um na sua, ora essa! Mas porque diabos (ops!) Deus em pessoa viria te buscar?

– Porque você é o maior dos ateus! - disse o velho, lendo sua mente - Servirá como exemplo àqueles que não se arrependerem na hora do julgamento. Você não cumpre o primeiro mandamento, o mais importante. Vamos pecador! É tempo de sentir minha cólera sagrada!

Cansado dessa história, você pega o revólver na cabeceira da sua cama e acerta um tiro na testa do velho. Ele cai, estertorando, pra trás.

– Puta merda!!! Foda-se! Legítima defesa… ele invadiu minha casa.

Você liga pra polícia, e avisa que atirou num maluco que invadiu sua casa. Os canas chegam e não encontram nada além do cheiro de pólvora. Corpo, bala, sangue…nada. Você toma um esporro colossal do guardinha que foi até sua casa, que avisa que do mesmo jeito terá que prestar depoimento na DP. Você ouve tudo se achando maluco, achismo que é compartilhado com os policiais, que te acham no mínimo, um drogado. Da pequena aglomeração na porta do seu apartamento, alguém grita: "Nietzsche!!!"

Lá fora, nuvens negras avançam rapidamente no horizonte. Muito rapidamente.

16.1.02

Caostrofobia



Aquantidadeabsurdadeimagensquebombardeiasuamentepodeestarsemvocêsaberteinduzindoafazercoisasquenaoquercriarhábitosque
nuncateria.Mensagenssubliminarescortamossinaisderádioetvevocênãopodefazernadaarespeitoanãoserevitaroqueháderuimnosmeiosde
comunicação.