27.12.01

Caos




Você repara em seu relógio que é quase a hora de ir embora. O dia foi atribulado no trabalho. Apesar de ser aquela eterna rotina, hoje a rotina foi maior. Pilhas e pilhas de vias e 2as vias para rubricar e carimbar, telefonemas para atender e clientes para receber. Nada fora do normal em uma vida tediosa. Extremamente tediosa. Seus braços doem tanto que você desejaria uma amputação rápida: pelo menos ia parar de sentir esse incômodo. Pra variar, você é o último da repartição a sair e deve faltar pouco para o faxineiro aparecer para limpar a área. Esse é o sinal de que você deve ir embora, pegar o carro, fazer o trajeto trabalho–casa, tomar um banho de 5 minutos, comer um lanche sozinho e desmaiar na cama, para estar disposto para o recomeço de tudo. Daí acontece uma coisa rara, que é você pensar na inutilidade da sua vida, na completa irrelevância que a sua existencia representa para os outros…para você mesmo…e inclusive para sua empresa. No seu trabalho, você nada mais é que um carimbador–rubricador–telefonista–recepcionista autômato. Uma máquina, um objeto.

No meio desses pensamentos, você nota que não sente mais dor nos braços. Aliás, nada mais doi no seu corpo. Um relaxamento nunca obtido antes toma você completamente, e você chega a agradecer por isso. Você está quase feliz – quase…afinal de contas, você nem sabe mais o que é ser feliz mesmo – quando vê chegar o faxineiro. Você quase inveja o trabalho dele, andando por todas as salas, mudando um pouco seus horizontes. Quase o inveja, porque nem isso você sente mais. Você tenta se levantar e – surpresa! – não consegue. Tenta se mover e nada responde. Pernas, braços, cabeça…imóveis. Você tenta gritar, mas não consegue…

O faxineiro se aproxima da sua mesa. Molha o pano no detergente e começa a passar na sua mesa…depois disso, começa a passar na sua cabeça. Na maior naturalidade.

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