29.1.03

Prosa do Desespero


Eu quero escrever algo como quem vomita. Estertorar o que há de bom nas palavras, morrer com elas. Tingir de rubro-sangue as paredes: perdigotos e frases vermelhas manchando o alvo de muros que nos encerram. Quero o ódio da sintaxe.

Quero palavras que rasguem esse céu azul, que tirem as pessoas da praia com sua torrente de eloquência numbica. Não restariam surfistas na ressaca de oratória. Suas ondas seriam muito fortes.

Quero palavras que transformem as púberes garotinhas hedonistas e fúteis, eternamente abraçadas aos seus ursinhos de pelúcia e gemendo à noite por seus astros em posters de parede em putas. Quero a devassidão das metáforas e a maldade dos solilóquios.

Guerras seriam criadas com as prosódias proferidas pela minha boca. Quero ser o inimigo público número um, caçado por todos os filólogos empedernidos e policiais truculentos. Farei de seus próprios dicionários e armas meu escudo.

Quero as últimas palavras do condenado. Quero minhas as palavras moribundas.

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