26.11.03

Esquinas




Perdida entre os abismos das esquinas, cai assim, a menina. Ela queda e sua queda não é física. Não há mais o que esperar, logo para ela que tanto esperou.

O corte das ruas e prédios e asfalto e carros ela segue adiante. Cada aceno, cada dedo, cada beijo mandado é uma navalha. Não, ela não tem opção. Quisera tivesse.

A nudez mais vestida e as roupas quase não-vestes é o que tem que usar. Expor a mercadoria e atrair possíveis compradores. As ruas, à noite, são quase um açougue.

Beija homens e mulheres. Beija o pai, o filho, a esposa. Beija o patrão, o empregado, o rico, o pobre. Beija o asfalto, as vezes. Esse é o beijo menos áspero.

Ela procura não pensar na injustiça do mundo, onde poderia estar se tivesse outra vida. De que adianta? Ela só se preocupa em oferecer o melhor simulacro de sentimento possível. Ela odeia cada um dos seus clientes, com todas as suas forças; ela ama todos os seus clientes, como se eles fossem os únicos homens da Terra.

Ela é apenas uma criança.

Sem comentários: