11.9.02

O escultor de montanhas




Meu trabalho leva séculos, milênios. A paciência é minha maior virtude. Moldo meu material com calma, levando em consideração cada uma de suas arestas, cada uma de suas fendas. Esculpo cada uma das minhas obras com afinco e dedicação, gerando peças monumentais.

Eu esculpo montanhas.

Tenho como ferramentas os elementos. Cordilheiras inteiras, com sua beleza grandiosa, criadas, vagarosamente, pela erosão. Mares, rios e chuvas cavando seu corpo; o vento espalhando seus fragmentos, pouco a pouco; o calor do fogo da lava, moldando seu interior; e a terra, a grandiosa terra, a mãe de todos os elementos, alma do meu labor, compondo tudo.

Dedico minha vida ao meu trabalho.

Sou alheio aos homens e seus corpos frágeis e mortais e suas obras insignificantes. A eternidade está ao meu lado e crio minhas obras sob o signo da perenidade. Gerações e gerações vêm e vão e sequer parte do que faço pode ser percebido pela humanidade. E eles, demonstrando sua eterna tolice e arrogância, ainda ousam me desafiar, quando desafiam o que crio. Quantos já feneceram, ao tentar galgar seus cumes? Quantas cidades, com suas frágeis montanhas de concreto, foram engolidas com um simples expelir da seiva quente dos meus picos? E quantos não foram soterrados por seu mar sólido, que descendo de seu topo destrói tudo que não tem sua força?

Minhas obras são maiores que os homens.

Eu sou o escultor de montanhas. Não procuro reconhecimento. Nada além do resultado do meu esforço pode me recompensar. Meu trabalho remonta ao início dos tempos e no fim deles ainda estarei na minha lida. O que mais poderia me envaidecer?

Eu e minhas esculturas estamos nas bordas do tempo.

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